quarta-feira, 8 de outubro de 2008

O ESTADO PREDADOR

Abel Aquino


Outro dia presenciei uma incursão, uma “razzia” dos soldados da prefeitura a algumas barracas de café e bolo na periferia de São Paulo, com uma eficiência que jamais vemos da polícia quando procura bandidos. Já presenciei dessas incursões no centro, na ladeira Porto Geral.
Lembro de uma cena na televisão, uma visão comovente de um camelô, fugindo com seu carrinho de pneu, pulando numa perna só, enquanto o toco da outra perna, atrofiada, balançava no ar. Atrás dele vinha um punhando de guardas da prefeitura, descendo o porrete a torto e a direito.

Mas, voltando a falar da “razzia” na periferia, o que me surpreendeu foi o fato de que não há mais local onde os tentáculos do poder não alcança. Esses chamados informais são vítima de um Estado elefante, gigante, comedor de dinheiro como poucos paises do mundo.
E nessa sanha de arrecadar mais e mais impostos instituem um estado policial, criminalizam todo meio de vida que não enquadra nos padrões de controle oficial. Os que não tiveram meios de superar a burocracia para abrir legalmente um negócio ou mesmo optaram por negócio clandestino, sem pagar impostos e taxas, até como forma única de viabilizar sua fonte de renda, são constantemente perseguidos.

O argumento básico é que os informais estão concorrendo de forma desleal com o comércio formal, aquele que recolhe impostos. Qualquer cidadão sensato percebe que a questão não é essa.
O problema é que, em face da altíssima carga tributária, processa-se, artificialmente, uma seleção natural na atividade econômica,ou seja uma grande parcela de nossa sociedade é condenada a impossibilidade de empreender atividade econômica apenas porque o Estado, em suas três instâncias, quer abocanhar boa parte da renda que é gerada por quem trabalha.

E o pior de tudo é que, praticamente, não há contrapartida. Se o dinheiro que vai voltasse em forma de serviço à sociedade, não estaríamos no pior dos mundos. Mas, não é isso o que acontece. Na periferia, onde o povo mais precisa, os serviços públicos não chegam ou chegam de forma precária e insuficiente.
Ao longo de nossa história o povo absorveu dos políticos a idéia de que o Estado existe para ajudar, para proteger uns dos outros, para inpedir injustiças, para educar, para cuidar da saúde de cada um de nós, para cuidar de tudo, enfim. Não queremos responsabilidade por coisa alguma, preferimos cobrar dos políticos. Mas acabamos esquecendo de um detalhe: quanto custa para a sociedade transferir ao Estado todo tipo de responsabilidade e obrigações, livrando-nos, individualmente, de peso de ter de cuidar de nós mesmos? Além disso, uma outra pergunta nunca foi respondida: será que o Estado pode realmente arcar com todo as responsabilidades e obrigações de uma sociedade moderna e conplexa? Será ele capaz disso? Mais uma pergunta ainda sem resposta: os políticos assumem eles próprios essas obrigações Estatais? O que vemos é o total descasamento entre as obrigações “oficiais” do Estado e a forma como os políticos manipulam as instituições aparentemente constituidas para assumir tais responsabilidades e obrigações, ironicamente rabiscadas, com zelo, na maioria das nossas inúmeras Constituições.

Mas, voltando ao assunto, ouvi um camelô questionando o fiscal da prefeitura:
- `Tô tentando viver do meu trabalho e ´ocêis vem e me tomam tudo! – querem que eu vá roubar, é?
-
Triste opção! E dizem que é função do Estado, defender os mais pobres!

Afirmam, os especialistas, que o tamanho do comércio informal é diretamente proporcional à dificuldade de se legalizar um negócio ou ao peso dos impostos. Portanto, quanto mais imposto, mais gente na informalidade, quanto mais difícil legalizar um negócio, mais gente vai optar por tocar seu empreendimento de forma subterrânea.

Isso parece óbvio, obvio até demais para qualquer um de nós, mas não para os políticos.
Na realidade nossos governantes escolheram o caminho que os leva inevitavelmente a sugar cada vez mais a sociedade. A forma como o Estado Brasileiro funciona ou mesmo a razão da sua existência é de parasitar a sociedade.
Nosso modelo de Estado é um modelo essencialmente predador, mas para ser predador sem despertar a ira de suas vítimas o Estado precisa mistificar sua missão. Por isso nossos políticos estão sempre prometendo cuidar de tudo para o povo.
Em toda eleição é a mesma ladainha: vamos melhorar a saúde, vamos acabar com as filas nos atendimentos, vamos por mais polícia na rua, vamos tapar os buracos das estradas. Mas quando chegam ao poder o espírito predador toma conta do político e seus apaniguados. Aí promovem a orgia da gastança pessoal e não sobra dinheiro para a saúde, para a segurança, para conservação de estradas. Nessa hora pensam em aumentar um pouquinho mais os impostos e assim por diante. É característica do predador a fome infinita.