Entre
cultivar uma crença qualquer e cultivar a curiosidade livre e sem barreiras
culturais e ideológicas, a primeira parece ser a preferida da maior parte das
pessoas.
É
difícil encontrar alguém capaz de ser livre, mentalmente desembaraçado das
crenças predominantes. Assim como a
história está recheada de barbáries cometidas em nome de Deus ou deuses, assim podemos
ver, ainda hoje, muita gente possuída por verdadeiros evangelhos de salvação, com
os quais é capaz de, no mínimo, desejar, a morte de todos aqueles que desafiam
suas crenças. Qualquer pessoa atenta percebe como a maioria também cultua o Estado
e suas instituições e conclui que esse culto não está baseado em análises
criteriosas ou investigações aprofundadas. Parece que as pessoas, primeiro, sentem
grande necessidade de abraçar uma crença qualquer, daquelas que os façam sentir
seguros, protegidos, parecidos com o bando predominante. Depois agarram desesperadamente essas crenças
que unem a multidão e que explicam tanta coisa com simplicidade, dividindo o
mundo em vítimas de um lado e algozes do outro. Sentem-se, evidentemente,
identificados com os que são considerados vitimas. É extremamente fácil ser
pobre e odiar o rico, ou mesmo o remediado. É, também tentador para os filhos bem
nascidos sentir pena dos que vivem na base da pirâmide social. Normalmente,
esses foram criados numa vida fácil, já que são cercados por conforto, num
mundo que parece ter sido feito para satisfazê-los, principalmente quando os pais substituem carinho e atenção
por presentes e agrados materiais. Daí ser surpreendentemente comum filhos de
ricos cuspirem no prato dourados em que comeram, para abraçar a causa dos oprimidos. São os
bem nascidos que organizam os pobres e dão argumentos ideológicos às crenças
que cultivam ressentimentos e inferioridades, tornando a vida dos pobres, não melhores, mas motivadas
e ousadas. Não sentem mais incomodados por desejar o bem alheio.
A música doce da ideologia da apropriação dos frutos
do trabalho alheio enfeitiça o pobre a tal ponto que ele percebe que, na
verdade, descobriu um meio de roubar sem que seja considerado ladrão, pois é
possível alegar que seu ato é um ato de reparação, de justiça tardia.