segunda-feira, 25 de agosto de 2008

O DRAMA DA PALMEIRA JUÇARA



A Mais Bela Palmeira da Mata Atlântica


Abel Aquino


Na época do descobrimento do Brasil, a palmeira Juçara, também conhecida por palmito doce, povoava toda a mata atlântica, desde o sul da Bahia até a divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul, indo pelo interior de São Paulo e do Mato Grosso do Sul.
O palmito dessa palmeira era muito apreciado pelo índios e com a chegado do homem europeu a derrubada da palmeira cresceu assustadoramente. No principio não havia comércio significativo do palmito; as pessoas colhiam para consumo próprio ou para venda em pequena escala.
Mas dos anos 60 para cá o comércio do palmito ampliou-se tremendamente; surgiram grandes indústrias exportadoras e por consequência a majestosa palmeira foi desaparecendo da paisagem. Toda a mata atlântica perdeu significativa parte de sua floresta: acima de 90% do que existia na época do descobrimento. Entretanto a palmeira Juçara perdeu mais, muito mais.
Hoje, a mata atlântica está praticamente órfã da sua mais imponente palmeira, sendo vista apenas nos parques estaduais, nas grotas inacessíveis de regiões montanhosas e em alguns jardins de cidades, onde se a usa para fins ornamentais.


O PAPEL ECOLÓGICO DA PALMEIRA

O quase desaparecimento da palmeira juçara provocou, por consequência, uma alteração drástica na vida da floresta.
Na mata era espécie chave, de grande importância para a sobrevivência de muitos animais e aves. É uma palmeira extremamente produtiva, com longo período de frutificação que vai de Janeiro a fim de junho. Os frutos alimentam macacos, tucanos, papaguaios e araras.As aves e os animais comem a polpa, deixam a semente e com isso fazem a dispersão natural de novas mudas pela floresta.


A PROIBIÇÃO

A partir de 1965, com a criação do chamado "Código Florestal", a lei 4.775, iniciou-se a tentativa de coibir o corte indiscriminado da Juçara. No início, tentou-se proteger a mata atlântica como um todo. A constituição de 88, a lei 7.803/89, e principalmente o decreto 750/93, caminharam nessa direção, sem contar as resoluções e atos dos diferentes órgãos do governo, tanto Federal quanto estadual. Mas ainda hoje as organizações não governamentais clamam por leis mais específicas para a proteção da mata atlântica e principalmente da Juçara.
A organização SOS MATA ATLÂNTICA vem liderando uma campanha para aprovação de leis mais duras nesse sentido.
Mas como a lei por si só não protege nada. A sorte da palmeira Juçara está entregue à capacidade de fiscalização do poder público. Com frequência os jornais noticiam a ocorrência de corte e venda clandestina do palmito.
E há conflitos armados entre a polícia florestal e os chamados palmiteiros que embrenham pelas matas a procura da palmeira, ficando alí por até três dias, cortando e ajuntando os palmitos em feixes que levam para serem vendidos em restaurantes ou na beira da estrada como é comum de se ver quando o paulistano viaja para o litoral. Muitas vezes eles montam rancho no meio da mata, fazem fogueira, cozinham o palmito e o colocam nos vidros, usando a água do rio mais próximo, sem o mínimo de higiene.
Ultimamente os palmiteiros, já não encontrando mais a palmeiras com facilidade, estão invadindo as reservas florestais para colher o palmito, como o Parque Estadual Intervales, O Parque Carlos Botelhos, o Petar e o parque de Itatiaia, desafiando os guardas florestais dessas regiões. No parque Intervales, um palmiteiro foi morte após enfrentar o guarda que tentava prendê-lo.


No município de Juquitiba, SP, em 2001, uma família foi presa por manter industria clandestina de beneficiamento do palmito.
Boa parte do palmito juçara vendido nos pequenos mercados e mercearias é de origem clandestina, com rótulos falsificados ou mesmo sem rótulos identificadores.



TRABALHO EDUCATIVO

Na realidade, essa guerra contra o palmiteiro, contra a extração clandestina, revela uma opção do poder público pela proibição e pela repressão, sem um mínimo projeto educativo de opoio. A visão autoritária de nossos políticos, travestidos de legisladores sem bom senso, evidente em outras áreas, revela-se, da mesma forma, nas questões ambientais. Se temos problemas em algum setor qualquer da atividade humana, os políticos se movem imediatamente para formas de repressão, castigos ou, na melhor das hipóteses, para formas burocráticas de providências. Raramente se fala em meios educativas de solucionar o problema. No caso da tentativa de proteger a palmeria Juçara, foi estarrecedor como os tradicionais palmiteiros ficaram sabendo que, de hora para outra, haviam se transformados em criminosos, violadores da lei. Muitos desses eram pais de família, sustentando suas crianças com a extração e venda do palmito e, de repente, se viram ameaçados de prisão. É claro que, pela repressão, se coibe até certo ponto a extração, mas transforma aqueles que não conseguem achar alternativas de renda ou que se revelam mais corajosos para afrontar a nova lei, em bandidos o que é, sob quaisquer critérios, um absurdo. Um processo educativo traria resultados mais lentos e de médio ou mesmo longo prazo, mas teria condição de estabecer um processo virtuoso de cultivo, extração e venda, com resultados permanentes. A palmeira juçara não estava sériamente ameaçada de extinção como se apregoou. Ela se reproduz de maneira extramamente fácil. Cada cacho costuma ter até 500 coquinhos e basta lança-los ao solo que 90% deles nascem. As entidades ambientalistas, da mesma forma que os políticos, correm atrás de defender formas repressoras de proibição da extração, em total desprezo pelo ser humano que porventura fique prejudicado ou tolhido por essas soluções arbitrárias. O resultado é que, sem um mínimo de atividade educativa das comunidades próximas a floresta, a extração não foi extinta, ficou invisível. Quem anda na mata vê os troncos caidos, os tocos mortos mas ninguém viu quem foi que fez aquilo.
A palmeira continua lentamente a ser derrubada.


PALMITO DE OUTRAS PALMEIRAS

Praticamente toda palmeira produz algum tipo de palmito, mas as principais e que possuem algum valor econômico são: "açaí", "pupunha", "palmeira real australiana" , "babaçu", “bacuri” e até a "guariroba", que dá um palmito amargo, muito apreciado no estado de Goiás.
A palmeira açaí é cultivada quase que exclusivamente no estado do Pará. Já a pupunha está sendo implantada em vários estados do país, como no Espírito Santo e no interior do estado de São Paulo.
Essas duas palmeiras são de clima quente e não toleram geada. Já a palmeira real da Austrália é cultivada principalmente no estado de Santa Catarina, pois resiste bem ao frio.
Alguns fazendeiros já cultivam a Juçara para produção de palmito. Mas seu ciclo de crescimento é lento e precisa de 8 a 10 anos para atingir o tamanho de corte e exige sombra nos 4 primeiros anos de vida, ou seja, ela só se desenvolve bem dentro de matas. A palmeira real e principalmente a pupunha são extremamente precoces, produzem palmito com 3 ou 4 anos de idade sob a direta luz do sol e podem ser cultivadas em forma de lavoura.
Todas essas alternativas provam que é possível acabar com o extrativismo predador sem acabar com o vidro de palmito na prateleira do mercado ou na mesa do consumidor. O manejo sustentável, o cultivo intensivo, as várias opções de paladar poderão enriquecer, de forma permanente, o prato do povo com essa iguaria tão saborosa. Mesmo que se insista em produzir o palmito juçara que, sem dúvida, é o mais refinado, basta deixar algumas dezenas de matrizes por hectare para que essa palmeira se perpetua, pois sua reprodução é fácil. Cada matriz produz até 1000 mil frutos por ano e os animais e aves, principalmente o esquilo, espalham por distâncias de centenas de metros. A própria lei prevê esse recurso, chamado de “ manejo sustentável”.
Portanto, podemos prever uma nova era para o cultivo do palmito, uma boa variedade de sabor, talvez até queda no preço e, o que é mais importante, a introdução definitiva da palmeira como um produto a mais da modernamente chamada “agroindústria”, incluindo aí o respeito a natureza, a preservação e o aperfeiçoamento do cultivo de tão nobre alimento.
O que dificulta a solução do problema é a absurda burocracia. Quem pensar em produzir palmito juçara, sem agredir o meio ambiente, mesmo que tenho toda a consciência de preservação do mundo, enfrentará o gigantesco cipoal de leis, normas, portarias e regulamentações, e ainda precisará estar munido da paciência de jó para conseguir alguma coisa.
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Primeira versão: julho 2002
Segunda: dezembro 2005
Terceira: agosto 2007

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